domingo, 28 de dezembro de 2008

Retalho 8 - 2008/2009

Passado que está o Natal, aproxima-se a passos largos o final de mais um ano.

É a altura para fazer um balanço do que ao longo dos últimos 365 dias aconteceu, daquilo que fizemos e sobretudo daquilo que ficou por fazer, dos sonhos que conseguimos transformar em realidade e dos que ficaram adiados, do nosso contributo para tornar melhor a vida daqueles que nos rodeiam ou a falta dele, enfim a relação entre o "deve" e o "haver" da nossa vida, assim como o da sociedade onde estamos inseridos.

O ano de 2008, no plano internacional, foi um ano "sui generis", que irá ficar na História como o ano em que se iniciaram grandes transformações na forma de viver das pessoas, como o ano em que finalmente grande parte dos responsáveis mundiais "acordaram" para realidade, que os mais atentos há muito denunciavam e eles teimavam em não ver.

Começou como um qualquer ano "normal", mas logo na sua "infância" se revelou diferente com o inicio da escalada do preço do petróleo, levando proeminentes economistas (eu não percebo nada de economia... mas eles também não!) a prever que até final do ano poderia chegar, catastroficamente, até aos 200 dólares por barril o tornaria insustentável a maior parte das economias dos países.

Na sua "irreverência de adolescente" mostra que algumas das maiores e mais proeminentes figuras da economia financeira mundial, que muitos veneravam e respeitavam, afinal não passavam de reles ladrões sem qualquer tipo de escrúpulos, de princípios, de valores, levando à ruína Países e milhões de pessoas.

Chegado à "idade adulta" revela como as realidades de hoje são relativas e rapidamente se tornam efémeras, o barril de petróleo não só não atingiu os tais 200 dólares, como fecha o ano abaixo dos 40... George W. Bush protagonista de uma das maiores mentiras da História e que levou à morte de milhares de pessoas (a invasão do Iraque) vai deixar, sem honra nem glória, (para alívio de milhões de pessoas) a presidência de uma das maiores potências mundiais agora também a necessitar de ajuda internacional, para tentar equilibrar as suas contas... o Mundo fica mergulhado numa crise de consequências ainda imprevísiveis e finalmente percebe-se globalmente a importância das energias, ditas alternativas.

Cá, neste sítio mais ocidental da Europa, as coisas não foram muito diferentes do resto do Mundo... os combustíveis subiram a uma velocidade vertiginosa e descem em "câmara lenta"... algumas das personagens das revistas "cor de rosa" são os tais ladrões de colarinho branco sem escrúpulos nem vergonha, a quem o poder deixou usufruir de lucros milionários e agora salva nacionalizando os prejuízos que milhões de contribuintes irão pagar... em nome de uma mentira, destruiu-se o sistema de saúde e o ensino público, para benefício de alguns em prejuízo de muitos.

Pessoalmente foi também um ano "sui generis", foi o ano em que abandonei, com alegria e sem qualquer nostalgia, ao contrário do que sempre pensei, a profissão de uma vida e, por força disso, parti à descoberta de novos caminhos quer pessoais quer profissionais.

A tradição manda desejar a todos um Feliz Ano Novo... não o vou fazer!
Apenas formular votos, que ele seja bem diferente deste que agora termina, que se "faça luz" nas cabeças pensantes que nos governam para que exista mais humanismo e menos tecnocracia nas suas decisões, de forma a que os efeitos da crise, provocada por alguns energúmeros, afecte o menor número de pessoas possível... que encerre o menor número de empresas e se perca o menor número de postos de trabalho possível... que as escolas voltem a ser um local de formação e não de confusão... que as pessoas sejam consideradas como Seres Humanos e não como um número (o de contribuinte)... que as crianças voltem a sorrir... SAUDAVELMENTE!!!!

Um abraço e até ao próximo.... RETALHO.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Retalho 7 - Professores e deputados

Um destes dias ao chegar a casa e ligar a tv, vi num dos vários canais, uma daquelas entrevistas típicas em que uma pseudo-figura pública vai a andar com um "batalhão" de jornalistas ao lado, de microfone na mão e a fazer perguntas, às quais o inquirido vai respondendo um pouco a contragosto.
Dizia então o entrevistado que, não tinha podido comparecer a uma reunião plenária do orgão a que pertence uma vez que, na véspera havia participado num jantar de angariação de fundos do Boavista Futebol Clube no Porto, que o mesmo tinha acabado já tarde, madrugada dentro e para percorrer os 320 Kms que separam o Porto de Lisboa de forma a estar presente na referida reunião não poderia dormir, ou dormiria muito pouco, não estando por isso em condições de estar presente.
Ao ouvir tais declarações pensei de imediato.... É "PROFESSOR"!!!!

Sim, porque só essa classe profissional, essa "cambada de malandros" responsáveis por todos os problemas deste sítio, que trabalha pouco mais de uma dúzia de horas por semana auferindo vencimentos chorudos, se pode dar ao luxo de ter tempo livre e dinheiro para participar neste tipo de eventos.

Como têm horário flexível e progridem na carreira até ao topo sem nunca serem avaliados, não necessitam de ter preocupações éticas com valores como a responsabilidade e a assiduidade, podendo ficar a gozar de um retemperador sono, depois de um fausto repasto e sem prejuízo das suas obrigações.

Por tudo isto recordei-me de um colega que tive há anos, pilar de um agregado familiar composto por ele, a esposa, a mãe, o avô e um bebé que vinha a caminho, residente a 520 kms do local de trabalho.

Um bom colega, pessoa de convívio fácil, sempre predisposto a uma brincadeira, a uma laracha e pronto a ajudar quem o necessitasse.

Nas tardes cinzentas de Outono, nas agrestes de Inverno ou nas calmas da Primavera, à sexta feira, por volta das seis e meia, lá se fazia ele à estrada para 8 horas de viagem no seu "confortável" Opel Corsa, (equipado com um sofisticado sistema de ar condicionado, ao tempo que estivesse lá fora), para chegar a casa por volta das 3 ou 4 horas da manhã de sábado.

No domingo, por volta da meia noite quando todos iam dormir, lá se fazia de novo à estrada para mais 8 horas de viagem e outros tantos quilómetros de regresso ao trabalho na segunda feira às 8,30 da amanha, não sem antes tomarmos o pequeno almoço na tascazinha que existia logo ali ao lado.

Não era uma noite sem dormir, nem sequer uma noite mal dormida foi assim durante.... um longo ano!

Era (e espero que ainda continue a ser) o Luís de.... Chaves, "DEPUTADO" de História, na então, Escola Preparatória de Santo André em pleno Litoral Alentejano.

Aiiiiiii... a minha cabeça, será que troquei as Profissões???

Um abraço e até ao próximo.... RETALHO
PS. Se por acaso leres isto Luís.... Um abração tamanho do Mundo.

sábado, 29 de novembro de 2008

Retalho 6 - Tardes de Inverno

Depois dos últimos dias bastante agitados, bem ao ritmo da minha nova ocupação, a informática, onde o tempo se mede em nanosegundos, eis que surgem alguns momentos de acalmia, daqueles em que o tempo passa devagar, fazendo lembrar o calmo entardecer na planície alentejana.
Aqui, tal como no Alentejo nesta altura do ano, está um tempo invernoso de chuva, frio e convidativo à permanência no nosso recanto, junto à lareira, com um bom livro, uma boa música, na companhia daqueles de quem gostamos e nos acompanham nesta caminhada da Vida.
Quando assim é, por entre o bater da chuva na vidraça, do sopro do vento frio lá fora, dos "castelhanos" (em alentejano, faúlhas que se libertam no fogo de quando em vez) a saltar na lareira, sempre nos lembramos daqueles que não estão connosco, de situações que com eles vivemos e recordamos com saudade.
É essa nostalgia e essa saudade que me vai no coração neste momento.
As lareiras tipicamente alentejanas onde nós e o fogo co-existimos no mesmo espaço, naquela chaminé enorme com os enchidos pendurados por cima das nossas cabeças, prontos a descerem em direcção ao fogo, para depois de assados no braseiro, acompanhar um bom "copo", que abrirá o apetite para uma sopa de feijão cozinhada na panela de barro lentamente ao longo do dia, naquelas brasas que também nos aquecem os pés.
Hoje, sentado no sofá junto à lareira, com a companhia do zé gato, diante de um televisor e tentando transmitir as minhas emoções ao teclado de um computador, recordo aquelas tardes de inverno da minha adolescência, onde não tinha estas "modernices" mas sim a companhia de um grupo de pessoas, familiares, amigos, conhecidos, uns mais velhos, outros nem tanto, uns de quem gostava muito, outros nem por isso, e.... a namorada.
Falava-se de tudo, sobre tudo, discutia-se tudo, cara a cara, olhos nos olhos, numa proximidade física que permitia descortinar em cada gesto, em cada olhar, as emoções que iam na alma de cada um de nós.
Sei que, para um ex-professor e agora técnico de informática, posso parecer retrógrado, bota de elástico, antiquado, avesso ao progresso, incoerente, etc... mas não me considero como tal, considero-me apenas alguém que tenta não perder o sentido crítico.
Sou um defensor acérrimo do progresso técnico, do avanço da tecnologia, da colocação de tudo isto ao serviço de todos nós mas.... e há sempre um mas... não posso deixar de lamentar o facto, de tudo isto ter contribuído de forma muito significativa, para que cada vez estejamos mais longe uns dos outros, na ilusão de que estamos mais perto.
Na verdade, as comunicações entre as pessoas estão à distância de um "click", mas elas estão bem mais distantes umas das outras.
Está nas mãos de todos nós corrigir isto!
Um abraço e até ao próximo.... RETALHO

sábado, 1 de novembro de 2008

Retalho 5 - Sábado de.... Portalegre


Portalegre, para a grande maioria das pessoas é sinónimo de uma cidade alentejana, com um papel importante na nossa história, onde nasceram os famosos, a nível mundial, tapetes de Portalegre.

Para os amantes do desporto automóvel é muito mais que isso, é a catedral (não gosto muito do termo porque se pode confundir com o Estádio da Luz) das corridas de todo o terreno no nosso País.

Sei que numa altura de crise económica e não só, falar de desporto automóvel pode parecer ofensivo. Acredito que sim, mas só para quem nunca esteve em Portalegre, para quem nunca viveu aquela corrida por dentro ou por.... fora.

A Baja 500 Portalegre (é assim que se chama a corrida) è uma festa de todos, para todos, e onde cada um "desempenha o seu papel".

Depois de alguns anos como participante na festa na qualidade de espectador, tive o privilégio de participar por dentro, em duas edições, sentado na baquet (nome dado aos bancos dos carros de corrida) do lado direito, ao lado do meu filho.

Foram duas experiências maravilhosas, indescritíveis e que hoje, sentado no sofá, a assistir à transmissão da TV me fazem passar na memória um misto de alegrias e tristezas, de recordações que me enchem os olhos com lágrimas de saudade.

A nossa primeira participação em termos desportivos foi infeliz, uma vez que dois "malvados" parafusos resolveram saltar do seu lugar e fizeram que que ficássemos ao Km 136 de prova, junto a um ribeiro, com uma roda pendurada, por volta das onze horas da manhã.

A nossa corrida acabava ali, a espera que nos viessem "resgatar" no meio da planície alentejana adivinhava-se longa (lá para o fim da tarde) e complicada, uma vez que o único alimento que tínhamos connosco era... água.

Puro engano, tivemos oportunidade de ver in loco e sentir pessoalmente que a corrida é uma festa daquelas gentes, que a solidariedade não é palavra vã por aqueles sítios, e quem vai para participar na festa está em... casa.

Num instantinho apareceu alguém, que encontrou um caminho alternativo, para que a nossa equipa de assistência pudesse chegar ao pé de nós, sem ter de esperar pelo fim da tarde. Colocado o carro em cima do reboque por volta das duas da tarde, fomos como que "forçados" a almoçar com aquela gente que, desde o momento em que saímos do carro até resolver da situação NUNCA nos deixaram sós e foram INEXCEDÌVEIS no apoio que nos deram.

Se alguém que, nesse dia, estava nesse grupo de Funcionários da Câmara de Mora ler estas palavras, o nosso reconhecimento, o nosso.... MUITO OBRIGADO!

Na segunda participação, terminámos a corrida com uma boa classificação por sinal, mas isso aqui é o que menos interessa, interessa sim referir a emoção muito forte, muito intensa, que se sente no fim do dia de sábado quando se chega ao parque de assistência final, a sensação de "missão cumprida", o calor dos abraços das pessoas que durante o dia esperam ansiosamente por aquele momento, a alegria estampada no rosto dos mecânicos porque o trabalho deles deu frutos, as felicitações dos "adversários" que não tiveram tanta sorte e ficaram pelo caminho, tudo isto depois de 500 Kms por fora de estrada, entre montes e vales, ribeiras e lamaçais, montados e eucaliptais, e sempre... SEMPRE... com gente ao longo da pista... ao longo dos 500 Kms. É a unica corrida onde isto acontece, por tudo isto Portalegre é... ÚNICO.

Não me considero saudosista mas, gosto de recordar as vivências porque passei e daí tirar força para correr atràs dos sonhos que ainda tenho, assim, se a "vida" me ajudar e a saúde me permitir... para o ano lá estarei de novo.... no SÁBADO DE PORTALEGRE.

Um Abraço e até... ao PRÓXIMO RETALHO

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Sete dias de vida

Passada que está uma semana sobre o "nascimento" deste espaço, é chegada a altura de fazer uma análise, ao que durante este tempo aconteceu.
Fui escrevendo, quando o trabalho da minha "nova profissão" me permitia, sem qualquer preocupação de estilo, de forma, de linguagem, apenas deixando fluir as emoções do momento, tentando transmiti-las da melhor maneira possível ao teclado do computador.
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Sempre entendi que a comunicação (o professor também é um comunicador), seja de que tipo for, utilize os meios que utilizar, só faz sentido desde que exista um binómio emissor-receptor (es), por isso é sempre importante conhecer se existe ou não feedback.
Nesse sentido, ao iniciar este "projecto" tomei a liberdade de divulgar junto de todos os meus contactos o "nascimento" do mesmo, convidar todos para que o visitassem e, se assim o entendessem, nele participassem.
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Depois destes dias, tenho de me sentir satisfeito e deixar aqui algumas palavras de agradecimento (seria injusto se o não fizesse)...
Em primeiro lugar à "minha Maria", que tem tido a paciência de ler todos os textos, analisá-los, comentá-los e incentivar-me para que continue,...
À Anabela, que tem acompanhado esta "retrosaria" diariamente, comentando os textos e, por vezes, relatando também algumas experiências da sua vida...
Ao Filipe, que divulgou a existência deste espaço junto de todos os seus contactos, (meus ex-colegas também) donde já me chegaram alguns comentários e palavras de incentivo...
À Teresa, que resumiu num "aprovadíssimo" o seu apoio....
Ao Ricardo que ontem me perguntava "porque não escreve um livro de memórias" (talvez um dia)....
A todos eles, e também àqueles que através de mensagens via telemóvel me têm incentivado.... o meu MUITO OBRIGADO!
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Não prometo um RETALHO por dia, nem por semana, não sou capaz de escrever quando quero, apenas quando as emoções ou as recordações "afloram", e aí sim, tento passar para o teclado o que me vai no pensamento, no coração, na alma.
Reafirmo contudo, e mais uma vez, que não pretendo este espaço meu, pretendo-o de TODOS aqueles que o queiram partilhar, com o seu contributo, relatando as suas experiências, as suas vivências boas ou más, as suas recordações, os seus pensamentos ou tão só para me dizerem.... "porque non te callas"!!!
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Fico à vossa espera e.... CONTO CONVOSCO.
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Um Abraço e até.... ao PRÓXIMO RETALHO

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Retalho 4 - Público e Privado

Estávamos no ano de 1961, era eu miúdo, tinha acabado de completar 6 anos e, por causa de uma Lei que nunca percebi, não podia entrar na Escola Oficial (como na altura se chamava) assim, os meus pais resolveram "mandar-me à escola" para uma escola paga (hoje Ensino Privado).

Estavam lá muitos meninos como eu, mas que não eram iguais a mim, não falavam com eu, sabiam dizer os "rs e os ls" , coisa que eu não era capaz (ainda hoje não sou) e talvez por isso, ao fim de pouco mais de uma semana, mandaram-me para uma carteira ao fundo da sala, e ai fiquei com estatuto especial, podia fazer o que me apetecesse, desde que não incomodasse e, assim lá estive até final do ano.

Por vezes sentia-me triste, ninguém me mandava fazer nada, ninguém me perguntava nada, estava entregue a mim próprio, ninguém dava pela minha existência... nem pela minha falta.

No ano seguinte, fui então para a Escola Oficial, para a 1ª classe, uma Professora nova, a Dª Helena (muito bonita), que não se importou que eu fosse diferente dos outros, tratava-me de forma igual, mandava-me fazer as coisas, elogiava-me ou criticava-me consoante eu fizesse bem ou mal, de vez em quando (poucas vezes é certo) lá vinha uma reguada mas eu sentia-me bem.... sentia-me igual aos demais!!

Assim segui até à 4ª Classe, e ao exame de admissão à Escola Industrial e ao Liceu.

Passados que estavam os exames, com aprovação em ambos, chegava a altura da primeira escolha, que em Moura era simples... Escola Industrial ou Colégio Particular (porque não existia Liceu).

Desde muito miúdo fui atraído pelas mecânicas e pela electricidade, por isso escolhi a Escola Industrial, no entanto, hoje recordo uma pergunta do meu avô à qual não dei importância na altura e hoje entendo perfeitamente, "tens medo de ir para o Colégio?"

Claro que respondi... NÃO, mas hoje até acho que sim, que tinha medo de me acontecer o mesmo que se tinha verificado no meu primeiro ano de escola.

Fui feliz na Escola Industrial, cresci como pessoa, como estudante, formei-me como técnico, segundo princípios de seriedade, de competência, aprendi a trabalhar em equipa respeitando os outros e as suas opiniões, na certeza que o sucesso se constroi com trabalho e em conjunto. Devo tudo isto, aos Bons Professores que felizmente me acompanharam, e a quem muito devo, pelo homem e o profissional que sou.

Ao longo da minha vida de professor, sempre tentei seguir estes princípios nas Escolas do Ensino Público por onde passei, daí que, ao ver as noticias de hoje acerca dos "rankings das escolas" me viessem as lágrimas aos olhos, misturadas com um sentimento de revolta que não consigo descrever.

Durante anos (muitos), como professor e profissional do Ensino Público fui obrigado, sim OBRIGADO, a implementar reformas sem nexo, a leccionar com metodologias didáctico/pedagógicas sem sentido, conteúdos programáticos idiotas em disciplinas e áreas disciplinares imbecis, em nome da obediência hierárquica estabelecida, sempre que alguma "cabeça iluminada" se lembrava de fazer uma reforma, à qual eu tinha de obedecer, sob pena de ser excomungado por via de um processo disciplinar.

Enquanto isto, o Ensino Particular (privado como agora se diz) manteve os seus padrões, os mesmo pelos quais eu estudei na Escola Publica, indiferente a reformas, a mudanças, a teorias, apenas se adaptando aos tempos modernos e às novas tecnologias.

Agora, chegam os "rankings" e constata-se a diferença de resultados... a qualidade do Ensino Privado é muito maior que a do Ensino Público e... os culpados disto?

Os culpados disto, por muito que me custe admitir somos todos nós!..

Os Professores, porque nunca souberam ou quiseram ser uma verdadeira classe onde a união e a solidariedade não fossem conceitos abstractos;

Os Pais, porque se têm deixado manipular pela máquina propragandistica da política, sem nunca perceberem que a exigência, a disciplina, o rigor, o esforço, são regras de ouro para o sucesso no ensino (tudo o que se continua a fazer no privado) e que o facilitismo leva ao... descalabro.

TODOS os ocupantes do ministério na Avenida 5 de Outubro, que ao longo de décadas sempre usaram demagogia barata, para satisfazer caprichos de pseudo pedagogos, pagos a peso de ouro, sem nunca terem feito nenhuma avaliação séria das (muitas) reformas do ensino a que assistimos ao longo dos anos, e que sempre contribuíram para a sua menorização.

Finalmente a comunicação social que assistiu a tudo isto, ao longo dos tempos, sem nunca ter sido capaz de dar voz às verdadeiras questões que afligiam o sistema de Ensino Publico, desmistificar as coisas, explicar as políticas, aclarar os objectivos menos visíveis, e sobretudo desmontar que, passo a passo, se ia caminhando para a morte do ensino público de qualidade onde eu estudei.

Hoje, com a passagem administrativa até ao 9º ano, que segundo tudo indica, vai ser aprovada, deu-se a estocada final no ensino público!!

O País fica mais pobre.... as contas bancárias das instituições de ensino particular agradecem!

Um abraço e até... ao PRÓXIMO RETALHO

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Retalho 3 - Mulheres e... Pares Pedagógicos

Desde há muito a esta parte, a Profissão de Professor foi desempenhada maioritariamente por mulheres.
Foram várias (não sei quantas) as que se cruzaram no meu caminho, com as quais trabalhei em regime de par pedagógico ao longo dos anos e de quem guardo as melhores recordações, não só pelo que me ensinaram, pela paciência que tiveram para me aturar, e sobretudo pela amizade que ficou.
Trabalhar em par pedagógico nem sempre é fácil. Cada um de nós tem a sua forma de estar na vida, de ver as coisas e o mundo, a sua maneira de encarar as mais variadas situações que se vão deparando no dia a dia, os seus gostos e pontos de interesse. Conciliar tudo isto, nem sempre é uma tarefa simples.
Considerando que as pessoas passam grande parte do dia juntos, trabalhar assim pode ser muito gratificante, ou muito penoso, dependendo da forma como as pessoas se relacionam uma com a outra.

Felizmente sempre me consegui relacionar sem problemas, com todas as colegas, umas em coexistência pacífica, outras em comunhão de espírito e, quando assim é, trabalhar em par pedagógico é realmente..... muito gratificante.
Saber que temos com quem dividir o trabalho, que temos quem faça por nós o que menos gostamos, quem nos "cubra as costas" nos nossos pontos fracos, quem nos adivinhe os pensamentos e intervenha antes de termos uma atitude irreflectida, que tenha sempre uma palavra de estímulo quando as coisas nos correm menos bem e o desânimo se apodera de nós, quem nos dê força quando o obstáculo parece intransponível, faz-nos sentir bem connosco próprios e realizados profissionalmente, o que transmite uma confiança enorme àqueles que connosco trabalham..... os alunos.

Tive a felicidade de me ter acontecido isto durante quinze anos. Foram os meus melhores anos no ensino.
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Neste RETALHO não podia, contudo, deixar de fazer uma refência especial, a uma das pessoas que profisionalmente mais marcou a minha vida... a D. Lina.

Uma mulher fantástica, a minha primeira Professora de Desenho, que tanto me ensinou, que me orientou os primeiros passos nesta disciplina e desenvolveu o meu gosto pelo desenho, ensinando-me desde muito novo a "ver com olhos de ver".
Quis o destino, ou as vicissitudes da vida como prefiro chamar-lhe, que dez anos depois, se viesse a tornar no meu primeiro par pedagógico.
Mais uma vez, a sua sabedoria, a sua paciência, a sua capacidade de motivação, a sua forma de me tratar já não como aluno, mas como colega (o que fazia questão de dizer a toda a gente) foram para mim motivo de orgulho, de satisfação, e de segurança perante as situações adversas que sempre enfrentamos no inicio de carreira. A ela, devo muito do que fui enquanto professor, da forma como estive no ensino, na maneira de me relacionar com os alunos, na forma de encarar e superar as dificuldades. Para ela, que infelizmente já não está entre nós, o meu.... MUITO OBRIGADO!

Um abraço e até.... ao PRÓXIMO RETALHO

sábado, 25 de outubro de 2008

Retalho 2 - O Nascimento de.... uma Terra!




Estavámos no ano setenta e nove, do século vinte, do passado milénio.
Dito assim, parece que foi há muito tempo, mas para mim e para as pessoas da minha idade.... foi ontem!
Era eu um "miúdo-homem", que pelas vicissitudes da vida (ou do concurso de colocação de Professores) trocou a vasta planície do Alentejo profundo, pelos areais do Alentejo Litoral fixando residência em Porto Côvo, na altura ainda uma aldeia de pescadores, de gente humilde, sincera, que me acolheu de braços abertos, e onde construí amizades que ainda hoje perduram.
Eram os tempos àureos do Projecto Industrial de Sines, a refinaria da Petrogal tinha começado a laborar à pouco tempo, a construção do complexo Petroquímico estava no auge, o terminal portuário de Sines estava em fase de conclusão e, por tudo isto, existia uma população flutuante de alguns milhares de pessoas a que o mercado habitacional da zona não conseguia dar resposta eficiente, fazendo disparar o preço das rendas de casa.
Para minorar esta questão, o então "senhor todo poderoso" Gabinete da Àrea de Sines construía um aglomerado habitacional de raíz a que chamava Cidade Nova de Santo André, no local conhecido pelo Areal, e para onde vim residir no final do verão do ano 1980.
Era na realidade um areal, onde havia sido instalado um gigantesco estaleiro de construção civil, entrecortado com algumas construções pré-fabricadas que serviam de alojamentos colectivos, A Vila Mina (hoje o Campus Universitário Piaget) onde se situava o único refeitório existente, ou já de betão e alvenaria, o Bairro Azul, o nosso "centro comercial".
Aí estavam instalados os únicos estabelecimentos comerciais, o talho, o mini mercado, o café, o barbeiro, e na rua, uma série de bancas de madeira com hortaliças e peixe, ao lado da barraca da D. Rosa.... era o nosso mercado.
É verdade... era tudo o que tinhamos!!!!
Farmácia, médico, bomba de gasolina, iluminação pública, telefone, ruas asfaltadas.... eram "luxos" que não conheciamos!
No entanto nas Pré-Fabricadas da Petrogal, na Lagartixa, na primeira fase da Empec (hoje Atalaia-Norte), assim como na primeira fase dos Caixotes e da AC (hoje Bairro das Flôres), residiam por cá umas centenas de famílias, provenientes das mais diversas origens, cujo ponto de encontro era o Clube Estrela do Areal (hoje Estrela de Santo André) ou a residência do Padre.
Eram condições de vida difíceis, mas que ajudaram a crescer muitos "miúdos-homens" como eu, e mostraram que a palavra SOLIDARIEDADE não é um conceito abstracto!
Foram alguns destes "miúdos-homens" que instalaram a então Secção de Santo André da Escola Preparatória de Santiago do Cacém (eu cheguei 2 anos depois), num edificio "suigeneris" (hoje Centro de Actividades Pedagógicas Alda Guerreiro) onde as salas de aula tinham apenas três paredes, uma vez que eram uma extensão do salão polivalente central, o almoço para os alunos vinha de Santiago do Cacém no carro dos Bombeiros, o telefone era o da obra e estava instalado num pinheiro, a energia elèctrica era fornecida por um gerador, e apesar de tudo isto, se viria a tornar num novo ponto de encontro da comunidade.
Foi lá que nasceu a primeira Associação de Pais e Encarregados de Educação de Santo André, o Grupo de Teatro GATO.SA, que se apadrinhou o nascimento do jornal "O Leme", de um Cine-Clube, se iniciou a prática de algumas modalidades desportivas como o badmington e o judo, se realizou o primeiro corso de carnaval de Santo André e, embora não tenha sido reponsável pelo nascimento de nenhuma delas, orgulho-me de ter vivido estes tempos, e ter tido o previlégio de dar o meu modesto contibuto para que se tornassem realidade.
Sei que, hoje, este post parece uma obra de ficção mas não... é apenas o resultado do que foi saindo expontaneamente para o teclado do computador, sem grande preocupação de rigor.
É mais um RETALHO DE VIDA, no entanto, atrevo-me a lançar um desafio no qual estou desde já pronto a colaborar, dado que, talvez fosse a altura certa para no âmbito da Autarquia, da Biblioteca, ou mesmo nas Escolas, numa ou várias àreas de projecto, tentar recolher e compilar as estórias... que juntas poderão fazer a História... de uma Vila sem História!!!!
Um abraço e até... ao PRÓXIMO RETALHO

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Retalho 1 - Na hora do adeus

Há dias voltei à Escola onde estive mais de vinte e cinco anos.
Ao longo de toda a minha vida profissional, nunca pensei de forma sistemática, no dia do adeus, no dia da minha ultima aula, no dia de arrumar as "tralhas" para regressar a casa. Fazia-o por vezes, quando algum colega se aposentava, mas rapidamente desviava o pensamento para outros assuntos, uma vez que esse dia ainda vinha longe... pensava eu.
E... ali estava ele, por opção minha é certo, mas tinha chegado.
Já com tudo arrumado para partir, um último olhar para as paredes, para os móveis, o painel de ferramentas, que ao longo do tempo, comigo conviveram diáriamente, e testemunharam de uma uma forma silenciosa as estórias que ali vivi, algumas das quais me passaram na mémoria, qual filme em movimento acelerado.
Recordei a estupfação estampada no rosto dos alunos acabados de chegar ao quinto ano, a sua cara de espanto, quando na primeira aula e apontando para o painel de ferramentas, dizia com voz austéra " Agradeço que não esqueçam isto durante a vossa vida... AS MAQUINAS E AS FERRAMENTAS NÃO PERDOAM ERROS", o que me valeu a inexistência de qualquer acidente grave em trinta e cinco anos de leccionação.
Vi os rostos de tantos e tantos miúdos, hoje homens e mulheres, que ao longo do tempo passaram por aquelas cadeiras e mesas, lembrei os seus sucessos e fracassos, o sorriso de satisfação após terem conseguido concluir com êxito, uma tarefa que à partida lhes parecia "impossível", como por exemplo construir um livro.
Lembrei-me de alguns deles... a Madga, que aos 12 anos desenhava vestidos de noite, que qualquer estilista não se importaria de assinar, do André que pintava em cerâmica como poucos, da criatividade do Deep, o rigor de trabalho do Ivo, a capacidade de adaptação do Gil a qualquer situação nova e.... tantos outros.
A construção do painel de ferramentas, da mesa de luz, da maquina de cortar esferovite, do painel de ajulejos, hoje colocado na entrada da Escola, a pintura manual de inumeras T-Shirts, que envergavam com um sentido orgulho.
Vieram-me à memória recordações da sala cheia com a turma que estava em aula normal e mais os outros que, quando tinham um "furo", procuravam a porta que sabiam, sempre aberta. Enfim..... A MINHA ESCOLA.
Era o tempo em que, hoje e na óptica de muitos, a escola não tinha qualidade, os professores não queriam fazer nada, trabalhavam poucas horas, não tinham rigor nem exigência, os alunos tinham de respeitar alguns princípios e valores, aprendiam a ler e interpetar, a calcular, adquiriam conhecimentos científicos nas mais variadas àreas, desenvolviam a sua capacidade psico-motora e a destreza física.
Hoje... tudo é diferente, para melhor dizem, há.... os PTs (Professores Titulares) para coordenar e avaliar os Professores... o PNL (Plano Nacional de Leitura)... o PNM (Plano Nacional da Matemática).... o PE (Projecto Educativo) .... o PAAE (Plano Anual de Actividades da Escola).... o PCT ( Projecto Curricular de Turma)... o PIT (Plano Individual de Trabalho).... as Planificações a... Longo.... Médio... e Curto Pazo... as Diárias.... o PA (Plano de Acompanhamento) ... o PR (Plano de Recuperação) ... as OTE (Ocupação dos Tempos Escolares)... o Choque Tecnológico... o Magalhães... as NO (Novas Oportunidades)... a Integração Plena... as Estatísticas... a CERTIFICAÇÃO!!!!!!!!!!!!
São, na minha óptica, planos a mais, papéis a mais, a maioria completamente inúteis, elaborados no sistema de "copy/paste", mas que tiveram o efeito de "ocupar" os Professores e desumanizar a Escola, a MINHA ESCOLA,... por isso parto sem a mínima saudade, com um sentimento de Libertação que nunca pensei sentir e com a consciência de que não contribuí para o "assassínio" ético-cultural de pelo menos uma geração.
Um Abraço e até ao.... PRÓXIMO RETALHO
Há sempre um dia!
Hoje, foi para mim esse dia.
O dia de criar o meu próprio Blog.
Hoje, trinta e cinco anos depois de ter abraçado a profissão de professor, já sem horários rígidos, sem obrigatoriedade de elaborar planificações, relatórios, estatísticas, planos individuais de aprendizagem, reuniões interminéveis e muitas vezes inúteis, senti a disponibilidade para partilhar o que me vai na "alma"!
Não pretendo fazer deste espaço nenhum compêndio de qualquer matéria ou disciplina, tão só que ele seja um espaço de encontro, de ideias, emoções, alegrias, tristezas, sonhos e desilusões em que o dia a dia de todos nós é.... fértil.
Enfim... RETALHOS DE UMA VIDA!!!