sábado, 29 de novembro de 2008

Retalho 6 - Tardes de Inverno

Depois dos últimos dias bastante agitados, bem ao ritmo da minha nova ocupação, a informática, onde o tempo se mede em nanosegundos, eis que surgem alguns momentos de acalmia, daqueles em que o tempo passa devagar, fazendo lembrar o calmo entardecer na planície alentejana.
Aqui, tal como no Alentejo nesta altura do ano, está um tempo invernoso de chuva, frio e convidativo à permanência no nosso recanto, junto à lareira, com um bom livro, uma boa música, na companhia daqueles de quem gostamos e nos acompanham nesta caminhada da Vida.
Quando assim é, por entre o bater da chuva na vidraça, do sopro do vento frio lá fora, dos "castelhanos" (em alentejano, faúlhas que se libertam no fogo de quando em vez) a saltar na lareira, sempre nos lembramos daqueles que não estão connosco, de situações que com eles vivemos e recordamos com saudade.
É essa nostalgia e essa saudade que me vai no coração neste momento.
As lareiras tipicamente alentejanas onde nós e o fogo co-existimos no mesmo espaço, naquela chaminé enorme com os enchidos pendurados por cima das nossas cabeças, prontos a descerem em direcção ao fogo, para depois de assados no braseiro, acompanhar um bom "copo", que abrirá o apetite para uma sopa de feijão cozinhada na panela de barro lentamente ao longo do dia, naquelas brasas que também nos aquecem os pés.
Hoje, sentado no sofá junto à lareira, com a companhia do zé gato, diante de um televisor e tentando transmitir as minhas emoções ao teclado de um computador, recordo aquelas tardes de inverno da minha adolescência, onde não tinha estas "modernices" mas sim a companhia de um grupo de pessoas, familiares, amigos, conhecidos, uns mais velhos, outros nem tanto, uns de quem gostava muito, outros nem por isso, e.... a namorada.
Falava-se de tudo, sobre tudo, discutia-se tudo, cara a cara, olhos nos olhos, numa proximidade física que permitia descortinar em cada gesto, em cada olhar, as emoções que iam na alma de cada um de nós.
Sei que, para um ex-professor e agora técnico de informática, posso parecer retrógrado, bota de elástico, antiquado, avesso ao progresso, incoerente, etc... mas não me considero como tal, considero-me apenas alguém que tenta não perder o sentido crítico.
Sou um defensor acérrimo do progresso técnico, do avanço da tecnologia, da colocação de tudo isto ao serviço de todos nós mas.... e há sempre um mas... não posso deixar de lamentar o facto, de tudo isto ter contribuído de forma muito significativa, para que cada vez estejamos mais longe uns dos outros, na ilusão de que estamos mais perto.
Na verdade, as comunicações entre as pessoas estão à distância de um "click", mas elas estão bem mais distantes umas das outras.
Está nas mãos de todos nós corrigir isto!
Um abraço e até ao próximo.... RETALHO

2 comentários:

  1. Também agora estou em frente à lareira... também aqui faz frio, e também estou acompanhada de umagato, desta vez uma gata de nome Tita. Na verdade quando vejo uma lareira, ou melhor uma fogueira, lembro-me nos inúmeros serões nos escuteiros à volta de uma fogueira, às altas horas da noite, a assar linguiças e a fazer torradas na esperança do chefe não acordar com as risadas. Enquanto o ouviamo-lo roncar, sabiamos que ele dormia e nós podiamos continuar o nosso "assalto" à fogueira, pois não podiamos ali estar.
    Mas isto são memórias que me levam para os escuteiros e as memórias que me levam para longe, quando olho para uma lareira, são memórias mais simples, pois a lareira só existe em minha casa à bem pouco tempo e as únicas memórias de lareira que tenho são as da casa da minha avó materna.
    Mas hoje, de volta do borralho, com a gata por companhia e um portátil no colo, posso dizer que, pelas benditas tecnologias vou saciando as saudades dos meus amigos. Vou lendo os seus pensamentos vou, cuscando aqui e ali....
    A lareira faz companhia mas.... as palavras... as vozes das pessoas amigas, são mais necessárias que bálsamo para a alma. Nós não somos umas ilhas, mas inevitavelmente, por vezes, acabamos sozinhos, com as tecnologias à nossa frente, um animal de pêlo a dormir e o cantar lento e compassado da lenha e da chuva a bater nas vidraças.
    Benditas sejam as tecnologias pois encurtam caminho, bentido seja o fogo que nos aquece, benditos sejam os peludos que nos acompanham e benditos sejam os amigos, que sempre nos aturam e nos ouvem ou "lêem"....

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  2. Como expliquei ontem não tenho a lareira infelizmente, mas tou bem no sofá e já li este novo retalho, mais um que gostei, incoerente não é, tem razão quando diz que as pessoas estão mais distantes do que apenas um "click", eu que o diga, que provavelmente os melhores amigos que tenho estão perto pela comunicação, distantes pelo contacto.

    Venham daí mais retalhos

    P.S.: A minha irmã ficou admirada quando viu o embrulho =D

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